Há alguns anos eu me pergunto se realmente a meia-entrada para estudantes e idosos é um passo para a democratização da cultura. A resposta que eu tenho encontrado é não.
Primeiro porque a meia-entrada é uma ilusão. Desde quando pagar R$14,00 reais para assistir um filme projetado numa sala com capacidade para 200 pessoas é “meia-entrada”? O que acontece é que, quem não é estudante ou idoso, está pagando uma entrada-dobrada. Ou seja, sai caro para o estudante e o idoso e sai absurdo para o recém-formado, para o desempregado, para o trabalhador de renda baixa, ou para quem tem mais gente para sustentar.
Em um estudo coordenado pelo professor da EESP Samy Dana, concluiu-se que o Brasil fica em quarto lugar no ranking dos cinemas mais caros do mundo. Isso sem contar os valores cobrados para shows, de todos os tipos, que há muito já não está para o meu bico.
Não me revolto. Aprendi a buscar formas alternativas de cultura e isso existe para todo lado, felizmente. O preço realmente não serve como desculpa para a gente ficar em casa. Se você quer, no entanto, uma atração mais comercial, é bom começar a pensar nisso e a economizar. A meia-entrada não existe.
De acordo com uma pesquisa feita pela FEA-USP, não há benefício real na meia-entrada, porque, como os beneficiários costumam ser muitos (entre 70% e 80% do público pagante na maioria das vezes), o valor médio da entrada é inflado. Ou seja, estudante e idoso não ganham nada e os demais só perdem. Claro que uma vez ou outra a gente nem se importa, afinal, hoje é dia dos namorados, e um programa típico de casal é ir ao cinema e tudo bem. Mas, vamos começar a pensar em formas alternativas de descontos. Pois se não pensarmos, outras cabeças menos bem-intencionadas vão pensar.
Já existe projeto de lei com a proposta de restringir em 40% o número de vagas para estudantes e idosos. E tem coisa muito pior vindo por aí. Num país onde os vereadores decidem reduzir salário de professor usando como argumento a responsabilidade fiscal, a gente pode esperar de tudo.
Também devemos saber que não é em todo e qualquer evento que o estudante tem direito de pagar meia entrada. Aqui estão os casos em que o estudante não possui esse direito:
1ª – Quando junto ao ingresso está agregado um serviço, a exemplo de shows e eventos que tem open bar. Nesses casos, não há como desvincular o serviço da entrada e, como o direito do estudante é apenas à entrada ao evento, não há como garantir o desconto.
2ª – Quando o evento tenha apenas o cunho de diversão. Algumas entidades usam como exemplo “festas have”.
Ainda acho questionável distinguir o que é cultura, o que é diversão. Ora, a diversão não é algo que a gente cultiva? E por que o estudante não tem direito a meio-pagamento para comprar um livro? Se estamos aceitando como cultura apenas aquilo que consideramos extremamente nobre, o livro deveria ser o primeiro a ser pensado. No fundo, no fundo, acho que tudo não passa de uma jogada política que perdeu o controle nos últimos anos. E criou sérios problemas para os produtores culturais e para os outros atores desse mesmo palco: todos nós.
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Tags: cultura cara, meia entrada, preços
12 junho, 2013 às 4:48 pm
Prezado, obrigado pela contribuição à discussão. Se quiser ter acesso à integra da Pesquisa da USP, a mesma se encontra no link abaixo:
Clique para acessar o USP_MEIAENTRADA_2013.PDF
Saudações