Nunca fui rata de biblioteca. Fato. Tanto que nunca paguei uma multa por atraso de livro e já paguei várias por atraso de filmes. Logo, isso traça um perfil de alguém que divide o tempo do intervalo (eu chamo de recreio) entre conversas com as amigas, fila da cantina e muitos carinhos pro namorado (meu colega!). Isso também traça o perfil de alguém que chama o intervalo de “recreio”.
É de se concluir que a biblioteca não está impregnada com meu cheiro, mas também não me é estranha. Desde que voltei de Vancouver, passei a frequentá-la mais. Em Vancouver as bibliotecas eram verdadeiros centros de informação, interatividade e atraíam as pessoas magneticamente. Passar por aquelas ruas dava vontade de ler. Entende?
Pois bem, voltei e fui pra biblioteca da faculdade. Peguei vários livros numa sexta-feira à noite. Renovei, renovei… quando foi ontem, tive que devolver alguns por não aceitarem mais renovações. Alguns deles, eu nem tinha aberto ainda. Entre eles, um chamado “Tutela de Urgência” do autor Ricardo Alessandro Castagna.. Ele ficou o tempo todo parado na minha escrivaninha por pura falta de tempo, pois interesse eu tinha/tenho. Quando fui devolvê-lo, vi que estava amassado, como se tivesse molhado. Ora, mas minha escrivaninha não molha. Então, fiquei tranquila e devolvi. O moço que recebe os livros perguntou se já estava assim e eu garanti que sim, pois sabia que não tinha sido eu. E mais, o livro estava entre vários outros livros na minha escrivaninha e só ele estava naquele estado. Ok, não era problema meu. Ele deu baixa e fui embora.
Hoje recebo um e-mail da coordenadora da biblioteca dizendo que quer conversar comigo. Fui lá. Ela veio questionar o estado do livro. Disse que não tinha sido eu, a menos que alguém disse entrado no meu quarto, molhado aquele livro e sumido.
Ela disse que a faculdade fez um inventário de todos os livros no final do ano passado e após aquilo, somente a sortuda aqui pegou o livro (lembrando que a capa dele estava intacta, só abrindo para perceber que tinha molhado). Eu, que sou calma, fui ficando nervosa. Ser acusada por algo que não fiz é aterrorizante. Ela não se alterou, disse que apenas marcaria aquele incidente na minha ficha, cobraria o valor do cara que aceitou o livro de volta e descartaria aquele livro. Fiquei chateada. 1º) porque não fui eu. Mesmo que tivesse chovido na minha mesa, o que não aconteceu, como só aquele livro ia ficar molhado e os outros não? 2º) fiquei chateada de ela cobrar uma coisa do carinha legal que está lá atendendo todo mundo bem. 3º) fiquei chateada que ela ia jogar fora um livro perfeitamente legível e muito menos nojento do que vários outros que a gente vê nas bibliotecas.
Fiquei na dúvida, será que compro o livro para mim para evitar esse problema com o funcionário que terá que desenbolsar o livro novo e evitar que o amassadinho seja jogado fora?
Outra coisa, quando cheguei em casa, descobri folheando outros livros que tenho emprestados de lá que “anotar na ficha” significa que você deixa de ser “réu primário” na biblioteca e uma segunda anotação implica no cancelamento da ficha. Além de estar escrito “leitor infrator” indicando o que, no caso, seria eu. Fiquei ofendida.
Penso que quando a gente pega algo emprestado, a gente fica muito vulnerável a esse tipo de imputação. Quase todo livro tem anotações feitas à lápis e não fui eu a responsável, mas se na hora de devolver quiserem me falar que fui, como provarei que não fui? O mesmo acontece com DVDs, por exemplo, em locadoras de vídeo. Certa vez, peguei um que já estava arranhado. Comentei na locadora e eles não cobraram, mas e se cismam que fui eu? Sei que o ônus da prova no direito do consumidor pode ser invertido em favor do hipossuficiente consumidor, mas e no caso do hipossuficiente leitor do livro que nem teve tempo de lê-lo? Como posso provar que não fui eu quem danificou a obra? E como posso resolver a situação da melhor forma?
Neste caminhar tenho percebido que a biblioteca nem sempre é uma pousada só de anjos.
Mais:
As bibliotecas mais lindas do mundo. (com fotos inspiradoras)
Vancouver Public Library (um cartão postal da cidade)
A biblioteca de Alexandria, um dos maiores acervos que a humanidade possuía
7 maio, 2010 às 1:02 am
Boa questão levantada, nunca tinha imaginado isso. E infelizmente é algo com imensa possibilidade de ocorrer já que como você mesma disse é impossível provar que não foi você a pessoa que “inutilizou” o livro em questão.
Eu gostaria até de saber se existe no exterior alguma forma de empréstimos que resolvam esse problema.
7 maio, 2010 às 4:40 am
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7 maio, 2010 às 12:17 pm
Acabeeeei de achar (sem querer querendo) a transcrição da aula magna do Comparato sobre o Direito e a mídia… lembra?
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=587CID002